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BNDES - Agência de Notícias

Fri Sep 20 02:57:09 CEST 2024 Fri Sep 20 02:57:09 CEST 2024

Blog do Desenvolvimento

Desenvolvimento sustentável, industrialização e o Sul Global

 

O evento States of the Future, realizado entre 22 e 26 de julho, no BNDES, no Rio de Janeiro, em paralelo ao G20, reuniu diversos atores globais, entre governos, academia, sociedade civil, think tanks, setor privado e organismos internacionais, para refletir sobre o papel do Estado em direção a um modelo de desenvolvimento mais sustentável e socialmente justo.
 
Em conversa com Fiona Tregenna, professora de Economia na Universidade de Joanesburgo, Ha-Joon Chang, economista sul-coreano e professor da Faculdade de Estudos Orientais e Africanos da Universidade de Londres, e Thelma Krug, vice-presidente do Intergovernamental Panel on Climate Change (IPCC), registramos alguns insights sobre desenvolvimento industrial no Sul Global no contexto da crise climática, e o papel do Estado. 

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Foto: Rossana Fraga e André Telles - Divulgação BNDES

 

Políticas industriais: debate e experiências de sucesso como caminho para o desenvolvimento do Sul Global

“Este evento abordou algumas das principais questões crescentes sobre desenvolvimento da atualidade: arquitetura financeira, desigualdade, sustentabilidade ambiental, o papel do Estado, e assim por diante. Em muitas dessas questões, as vozes dominantes são oriundas do mainstream e não levam em consideração as desigualdades, poder, recursos e outros imperativos para o Sul Global em termos de desenvolvimento, recuperação e prosperidade sustentável e inclusiva.
[...]
A política industrial e a industrialização são realmente cruciais para que o Sul Global se desenvolva e alcance as economias avançadas e, em última análise, alcance crescimento, criação de emprego e desenvolvimento social. Há tantas lições, nas últimas décadas, de experiências bem-sucedidas de industrialização e transformação estrutural que, em última análise, mudaram a vida das pessoas de forma muito real. No fim, é sobre oportunidades de vida e a industrialização contribuindo para crescimento, capacidades e renda que podem fazer a diferença entre uma criança ter ou não ter o que comer no fim das contas. 

Portanto, há muitas lições que podemos aprender com políticas industriais, com histórias de sucesso, dessas últimas décadas, ao mesmo tempo em que incorporamos algumas das novas direções das políticas industriais e da industrialização – a mudança tecnológica, a importância da industrialização verde ambientalmente sustentável, inclusão, e assim por diante. O painel debateu algumas dessas questões. Estou ansiosa para ouvir o restante dos palestrantes. O meu próprio país, a África do Sul, assumirá depois do Brasil a presidência do G20, e espero que possamos continuar esses debates no próximo ano e fazer algum tipo de diferença a nível internacional.”

Fiona Tregenna

 

 


Industrialização versus clima nos países em desenvolvimento: há contradição?

“Estamos nos aproximando rapidamente de um ponto de não retorno em termos de alterações climáticas e outras crises ecológicas: a poluição dos mares com plástico, o desmatamento na Amazônia, a poluição dos rios e mares com produtos químicos e esgotos. Portanto, precisamos realmente nos concentrar criticamente na descarbonização da economia. Mas quando se trata do potencial conflito entre desenvolvimento e descarbonização, penso que os países em desenvolvimento têm o direito de utilizar quaisquer meios, mesmo que envolvam atividades com elevada emissão de carbono, para desenvolver e melhorar as suas economias a) porque não contribuíram muito com emissão de gases de efeito estufa na atmosfera, gerados majoritariamente pelos países ricos, que poluíram o mundo sem saberem que estavam destruindo todos; mas b) também porque a industrialização e a modernização da economia são o que realmente precisamos para, a longo prazo, reduzir o impacto do carbono da nossa economia já que, como sabemos, a agricultura e as atividades relacionadas geram um quarto do carbono global. 

Quero dizer, quando você cultiva arroz, especialmente em campos alagados, quando você derruba florestas para criar gado, como é feito no Brasil, você está na verdade aumentando a intensidade de carbono e, como a agricultura é relativamente menos produtiva, isso significa que se você quiser atingir a mesma condição de vida, é preciso destruir o meio ambiente de forma muito mais agressiva e gerar muito carbono direta e indiretamente. Então, na verdade, o desenvolvimento da economia, no curto prazo, poderá gerar mais carbono, mas, no longo prazo, reduzirá a nossa pegada de carbono, porque não só reduzirá a necessidade de destruir o ambiente para gerar mais exportações, mas também nos dará a capacidade de desenvolver melhores tecnologias de energia renovável, nos dará a capacidade de desenvolver tecnologias e produzir coisas como aço, cimento e fertilizantes que dependem basicamente do combustível fóssil não apenas para a energia, mas também para a matéria-prima. 

Então, na verdade, precisamos aumentar as nossas capacidades para gerar melhores tecnologias energéticas e melhores tecnologias para produzir coisas como aço, cimento e fertilizantes com uma pegada de carbono mínima. Então, na realidade, a longo prazo, é melhor que os países em desenvolvimento desenvolvam rapidamente a sua indústria e capacidades, a fim de, em algum momento, serem capazes de reduzir a nossa pegada de carbono e, ao mesmo tempo, aumentar o nosso nível de vida.”

Ha-Joon Chang

 

 

O papel do Estado na gestão do desenvolvimento e da crise climática

“O papel do Estado é fundamental para assegurar o desenvolvimento sustentável, não só o desenvolvimento sustentável, mas a erradicação da pobreza, a redução das desigualdades e, fundamental também: o compromisso que os Estados assumiram na implementação dos objetivos do desenvolvimento sustentável. Esses são entre si já desafiadores. A implementação não é simplesmente sinergética com a questão da mudança do clima, que é a minha área, ela pode também ter efeitos negativos em potencial. Então, cabe ao Estado justamente fazer uma gestão reguladora, entender onde é que estão essas sinergias do desenvolvimento sustentável com questão da mudança do clima e aí tentar minimizar esses impactos. 

Eventos dessa natureza [States of the Future] permitem a gente conhecer mais também sobre os desafios, sobre outras perspectivas. A minha perspectiva é clima, e o desenvolvimento sustentável é extremamente ameaçado pela mudança do clima. O meu olhar é muito focado. Agora, quando você tem um painel como a gente teve aqui hoje, você vê a diversidade de visões com relação a muitos outros elementos que normalmente não estão no meu discurso.
[...]
São muitos [os desafios para o desenvolvimento sustentável e inclusivo]. Alguns pontos que foram levantados... justamente essa questão de recursos, ou seja, como é que os recursos que são idealizados para determinadas atividades – vamos assim dizer, discutidas – depois são canalizados para outros fins. Ou seja, a gente sempre diz – foi parte da minha fala – que não é questão de falta de recursos, é a questão de como é que a gente usa esses recursos de maneira que se possa assegurar o desenvolvimento sustentável, a questão da erradicação da pobreza, a questão da desigualdade. 
A gente vê o país indo rumo a algumas dessas mudanças, mas precisa mais e muitas vezes não tão dependendo do governo em si, mas de outros atores que não necessariamente estão olhando para o bem do país, mas estão olhando simplesmente para os seus próprios benefícios. Então isso é um desafio enorme que eu vejo. É a democracia sendo exercitada, mas são os desafios que a democracia impõe também a todos nós. Isso certamente vai mudar e a democracia vai vencer cada vez mais.”

Thelma Krug 

 



[Transcrição de depoimentos orais. Tradução livre]

 

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