
Alguns conceitos sobre biodiversidade
Natureza, ecossistema e bioma
Já vimos aqui que diversidade biológica ou biodiversidade se refere à variedade de vida no planeta, intraespécie (dentro da mesma espécie), interespécies (entre diferentes espécies) e de seus ecossistemas.
A natureza pode ser compreendida como o mundo natural com ênfase na diversidade dos organismos vivos – inclusive pessoas –, em suas interações e em sua relação com seu ambiente. A natureza é composta por quatro reinos – terra, oceano, água doce e atmosfera – e inclui recursos não vivos como aquíferos, minerais e reservas fósseis. As pessoas, assim como empresas e instituições financeiras, fazem parte da natureza, da qual dependem e na qual causam impactos. Sendo assim, a biodiversidade faz parte da natureza e os dois conceitos não são intercambiáveis.
Ecossistema, por sua vez, é um complexo dinâmico de organismos vivos (plantas, animais e microrganismos) e ambiente não vivo (terra, água, clima...), que interagem como uma unidade funcional.
Enquanto bioma é uma região em escala global, geralmente definida pelo tipo de vida que lá predomina em resposta ao ambiente e ao clima, o ecossistema é uma unidade menor e mais específica. São exemplos de biomas, savana e floresta tropical. Falamos no post anterior dos biomas brasileiros: Amazônia, Mata Atlântica, Cerrado, Caatinga, Pampa e Pantanal. Os biomas são formados por um conjunto de ecossistemas. Por exemplo, dentro da Mata Atlântica, existem diversos ecossistemas como as florestas ombrófilas densa e aberta, a mata de araucária, os campos de altitude, as vegetações de restinga e os manguezais.
A biodiversidade é fundamental para o funcionamento e a resiliência dos ecossistemas e, consequentemente dos biomas, assim como para a provisão de serviços ecossistêmicos.
E o que são os serviços ecossistêmicos?
Serviços ecossistêmicos são os benefícios diretos e indiretos obtidos por seres humanos por meio dos ecossistemas ou, em uma visão mais ampla, a contribuição – positiva ou negativa – da natureza para as pessoas.
A natureza contribui para a qualidade de vida das pessoas por meio de materiais (como energia, alimentos, plantas medicinais), pela regulação (do clima, do solo, dos oceanos) e por meio de contribuições não materiais (como culturais, recreacionais, espirituais).
Pelo ponto de vista da sociedade, a natureza pode ser entendida como um conjunto de ativos que prestam serviços ecossistêmicos. As pessoas, empresas e organizações financeiras, por exemplo, dependem da natureza – dos serviços ecossistêmicos –, assim como a impactam positiva ou negativamente.
Fonte: Elaboração própria com base em TFND.
A TFND considera que os impactos podem ser diretos (uma mudança no estado da natureza causada diretamente por uma atividade – ex. desmatamento), indiretos (uma mudança no estado da natureza causada indiretamente por uma atividade – ex. mudanças climáticas decorrentes de emissões de GEEs) ou ainda cumulativos (mudança no estado da natureza causada pela interação de atividades de mais de um ator em um mesmo local – ex. redução da população de uma espécie em função de diversas ações humanas, como pesca, poluição e outras ações de degradação da natureza).
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A TNFD (Taskforce on Nature-related Financial Disclosures) é uma iniciativa global, liderada pelo mercado, criada em 2021 para ampliar a produção e divulgação de informações financeiras relacionadas com a natureza. É possível que as recomendações da TNFD, lançadas em 2023, sejam incorporadas na regulamentação do Banco Central do Brasil para o setor financeiro nacional, assim como aconteceu recentemente com a TCFD (Taskforce on Climate-related Financial Disclosures).
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Dependências da natureza
Segundo publicação de 2023 da PwC, mais de 50% do PIB global é alta ou moderadamente dependente da natureza.
Das vinte indústrias analisadas, cinco – responsáveis por cerca de 12% do PIB global – têm a totalidade de suas operações diretas altamente dependentes de serviços ecossistêmicos. Isto significa que alterações ecossistêmicas têm o poder de eliminar o retorno financeiros dessas indústrias. São elas agricultura, silvicultura, pesca e aquicultura, alimentos, bebida e tabaco e construção.
Outras 11 indústrias têm pelo menos 35% do valor econômico de suas operações ou de sua cadeia de fornecedores com alta ou moderada dependência da natureza. Nesses casos, alterações ecossistêmicas podem resultar em impacto substancial em seus resultados financeiros.
Além disso, ao analisar 19 grandes bolsas de valores, o estudo concluiu que mais da metade do valor de mercado das empresas listadas está sujeita a riscos de mercado, tendo em vista a alta ou moderada dependência da natureza dessas companhias.
Exemplo: A dependência da natureza da indústria automotiva ao longo de sua cadeia de valor
Cadeia de fornecedores | Fabricação | Clientes diretos | ||
Fornecedores de matérias-primas obtêm madeira, borracha e outros materiais naturais renováveis da natureza; companhias de mineração usam água para extrair e refinar o lítio usado nas baterias elétricas dos veículos. | Produtores usam água em processos de fabricação. | Distribuição e vendas: revendedores de automóveis dependem da regulação natural da absorção das chuvas para se proteger de enchentes. | ||
Riscos associados | Riscos associados | Riscos associados | ||
Risco reputacional associado a possível desmatamento por fornecedores de madeira e escassez de água causando a redução das operações de companhias de mineração. | Escassez de água pode aumentar os custos de operação dos fabricantes. | Redução da capacidade de regulação natural da absorção das chuvas resultando em enchentes mais frequentes e mais interrupções no serviço em função delas. |
Fonte: PwC.
Oportunidades relacionadas à natureza
As oportunidades relacionadas à natureza, por sua vez, são atividades que criam impactos positivos e/ou mitigam impactos negativos na natureza, gerando resultados positivos para a vida, especialmente para as pessoas e para as organizações. As oportunidades podem vir de evitar, mitigar ou gerenciar os riscos ligados à natureza e aos serviços ecossistêmicos dos quais a organização/sociedade depende, como reduzindo o uso de materiais e energia na produção, na logística, ou no consumo; ou ainda podem vir da transformação de modelos de negócio, produtos, serviços, mercados e investimentos com objetivo de deter ou reverter danos à natureza – como conservação, restauração etc. Melhor ainda quando são adotadas soluções baseadas na natureza para obter os bens e serviços oferecidos, a exemplo das atividades da bioeconomia. Ou ainda quando isto é feito com a inclusão das populações locais, ao que chamamos de sociobioeconomia.
Para as empresas, gerir impactos sobre a natureza não é mais uma questão de responsabilidade social corporativa, mas uma questão estratégica de gerenciamento de riscos.
No entanto, a importância de preservar a biodiversidade e a natureza é uma questão que transcende as empresas. Como veremos na próxima newsletter, é cada vez mais necessária uma união do setor público e privado para transformar a nossa relação com a natureza, preservando a biodiversidade.
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