Agropecuária sustentável e crédito rural no Brasil
O Brasil é, e deve continuar a ser ao longo dos próximos anos, um dos principais fornecedores mundiais de produtos agropecuários. Em um cenário em que o planeta demanda cada vez mais alimentos, fatores como disponibilidade de recursos naturais e conhecimento tecnológico acumulado explicam o papel central do país na alimentação da crescente população global.
Na economia nacional, também é grande o peso das atividades agropecuárias: nos últimos dez anos, o agronegócio correspondeu a algo entre 22% e 25% do produto interno bruto (PIB) brasileiro.
Não obstante essa relevância para o país e para o mundo, as taxas de desmatamento observadas no Brasil constituem uma ameaça à agropecuária nacional, uma vez que afetam o clima e a disponibilidade de recursos hídricos, variáveis que influenciam a capacidade de produção de alimentos. Além disso, os impactos ambientais do setor agropecuário brasileiro também afetam as relações comerciais do país com compradores de commodities estrangeiros, o que consiste em mais uma ameaça ao crescimento econômico nacional.
Nesse contexto, promover a adoção de práticas agropecuárias sustentáveis ganha relevância. E uma maneira de fazer isso é por meio do crédito rural.
Cabe aqui esclarecer o que se entende por agropecuária sustentável – ou agricultura de baixo carbono, como outros órgãos do governo brasileiro a denominam. Trata-se de um conjunto de práticas que buscam aumentar a produtividade – e, consequentemente, a renda gerada com as atividades –, adaptam e criam resiliência às mudanças climáticas e reduzem as emissões de gases do efeito estufa, sempre que possível.
No Brasil, o crédito rural tem sido o principal instrumento de política agrícola para promover a produtividade e o aumento de renda. Criado em 1965 e vigente ainda hoje, o Sistema Nacional de Crédito Rural (SNCR) é constituído por fontes públicas e privadas de financiamento e, atualmente, tem por objetivos principais: (i) proporcionar acesso ao crédito rural com taxas de juros abaixo das taxas de mercado, (ii) reduzir a resistência das instituições financeiras em financiar o setor rural e (iii) incentivar as atividades de pequenos produtores e agricultores familiares por meio de crédito direcionado.
O gráfico acima apresenta a evolução da disponibilidade de crédito rural no país no período 1999-2013. Nota-se que os recursos financeiros disponibilizados para o setor têm aumentado consideravelmente, tendência que persistiu, ao menos, até meados de 2016.
Pelo gráfico, percebe-se também que o crédito tem sido direcionado principalmente para custeio de produção – para despesas como preparação do solo, plantio de sementes, limpeza de terras, colheita e compra de insumos (fertilizantes, sementes, herbicidas e ração e vacinas para animais) – e da comercialização de produtos. Bem menor, comparativamente, tem sido a participação do crédito rural para investimento, utilizado para a compra de bens duráveis, como maquinário e equipamentos.
Em que pese sua importância, cabe frisar que o SNCR não é a única fonte de financiamento agrícola no Brasil. O gráfico a seguir mostra que 72% do total de empréstimos realizados ao setor em 2003 tiveram como origem fontes externas ao sistema, tais como recursos próprios, empréstimos familiares e financiamentos por parte de bancos privados e fabricantes de insumos.
Apesar dessa maior participação no financiamento da agropecuária nacional, as condições (taxas de juros e prazos) dos financiamentos oriundos de fontes externas ao SNCR costumam ser bem menos vantajosas em comparação com o crédito do sistema. A explicação para esse maior percentual referente a fontes que não do SNCR reside em fatores como histórico de crédito ruim, falta de informação e/ou de familiaridade para se relacionar com instituições financeiras, dificuldades para atender aos critérios de acesso às linhas de crédito com condições especiais, entre outros.
Foi nos últimos dez anos que o SNCR passou a contar com linhas de financiamento voltadas à disseminação de práticas agropecuárias sustentáveis. Programas como o ABC, criado em 2010, e o Inovagro, lançado em 2013, indicam a atenção que o Brasil vem dando à conservação dos recursos naturais e ao crescimento das atividades agropecuárias de longo prazo. Além disso, o incremento proporcional do crédito voltado a investimentos observado nos últimos anos também constitui uma janela de oportunidade para a expansão de sistemas sustentáveis de agricultura.
O conteúdo desse texto foi extraído e adaptado do artigo Crédito rural no Brasil: desafios e oportunidades para promoção da agropecuária sustentável, de Desirée Lopes, Sarah Lowery e Tiago Luiz Cabral Peroba (este último, empregado do BNDES), publicado na Revista do BNDES 45.
Referências:
BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Crédito rural: programação e aplicação de recursos. Brasília, 2014.
SANTANA, C. A. M.; NASCIMENTO, J. R. Public policies and agricultural investment in Brazil: final report. Brasília: Food and Agriculture Organization of the United Nations (FAO), 2012.
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