
5 propostas para a educação no Brasil
A educação é um dos principais determinantes do desenvolvimento econômico. Essa afirmação deriva de análises empíricas bastante robustas. Não importa o período amostral; não importa o conjunto considerado de países (desenvolvidos e/ou em desenvolvimento); não importa se há ou não outras variáveis de controle nas regressões. Uma educação de qualidade parece ser sempre crucial para explicar o crescimento de longo prazo, como sinaliza estudo de Hanushek e Woessmann (2010).
A educação também é importante para o desenvolvimento social. Além de beneficiar as pessoas diretamente atendidas, a educação pode gerar externalidades positivas para a sociedade, como: reduzir a criminalidade, aumentar a consciência política (melhorando a democracia), reduzir a ocorrência de gravidez indesejada, conscientizar a população em relação a vícios, melhorar a comunicação interpessoal, dentre outros benefícios que, segundo Barbosa-Filho e Pessoa (2010 - PDF - 0,3 MB), podem fazer com que a taxa de retorno social da educação supere a taxa de retorno privado.
Qualidade da educação no Brasil
Existe ampla evidência de que a qualidade da educação no Brasil é deficiente. Na última avaliação internacional do Pisa, em 2015, ficamos em 63º lugar em um ranking de 70 países. Além da média das notas brasileiras ser muito baixa, sua distribuição é ainda pior: há um percentual enorme (70%) de jovens com desempenho insatisfatório (níveis < 2) e um percentual bastante reduzido (1%) de jovens com desempenho de excelência (níveis > 4) – ver Gráfico 1.
Gráfico 1 - Distribuição das Notas do PISA de Matemática (2015) em países selecionados
Nos últimos 40 anos, o país conseguiu colocar quase todas as crianças na escola, sobretudo no ensino fundamental (taxa líquida de matrícula é de 96,5%), aumentando a escolaridade da população. No entanto, esse aumento não se traduziu em ganhos de produtividade para o país, ao contrário do observado em outras nações. A baixa qualidade da educação é o principal fator explicativo para este mau desempenho, como apontam Woessmann e Hanushek (2012 - PDF - O,6 MB).
Gráfico 2 - Anos de estudo vs. produtividade do trabalho no Brasil e em países selecionados
Como lidar com o problema da baixa qualidade da educação?
Após ampla reflexão interna, amparada por contribuições de diversas instituições ligadas à temática da educação e de especialistas das esferas pública, privada e do terceiro setor, o BNDES chegou a um diagnóstico sobre questões fundamentais que precisam ser enfrentadas para melhorar a educação no país e que podem orientar a atuação do BNDES - a exemplo do que foi apresentado no Seminário Educação e Produtividade, com o pesquisador Ricardo Paes de Barros.
São elas:
1) gestão deficiente das redes de educação básica (que compreende a educação infantil e os ensinos fundamental e médio);
2) baixo uso de tecnologias digitais na educação, como ferramenta pedagógica e de gestão, sobretudo nos segmentos de ensino fundamental e médio;
3) lacunas na formação do corpo docente; e
4) baixa atratividade do ensino médio e desafios da reforma e da implementação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), incluindo formação técnica e profissionalizante.
Um estudo recém-lançado pelo Banco Mundial, intitulado Realinhando Políticas Educacionais (PDF - 3,6 MB), que investiga as causas do baixo aprendizado no Brasil, apresentou conclusões similares.
Dado o diagnóstico, é fundamental formular ações bem-desenhadas e ter capacidade para implementá-las de forma efetiva, não bastando apenas boas intenções.
Um primeiro passo é aprender com as experiências de sucesso. Diversas intervenções que se mostraram efetivas em países em desenvolvimento podem servir de exemplo. O estudo Melhorando os Resultados Educacionais em Países em Desenvolvimento: lições de avaliações rigorosas (PDF - 0,3 MB) resume as lições aprendidas em 223 avaliações de impacto em 56 países emergentes.
Além disso, há experiências bem-sucedidas no próprio país, de municípios que fizeram avanços na área educacional. As cidades de Sobral e Brejo Santo, no Ceará, possuem escolas públicas com desempenho superior à média das escolas privadas de São Paulo nas avaliações do IDEB, que podem ser analisadas e replicadas em outras localidades.
O que o BNDES pode fazer para melhorar a qualidade da educação no Brasil?
Em vários países, bancos de desenvolvimento atuam no estímulo ao mercado de educação, tanto pelo lado da oferta – ampliando a disponibilidade e a qualidade da educação, quanto pelo lado da demanda – concedendo financiamento estudantil.
O BNDES dispõe de uma rica base de aprendizado para nortear uma atuação mais expressiva na área. Os desafios passam por reforçar o papel do Banco como indutor de investimentos qualificados, articulador de parcerias entre atores estratégicos e promotor do adensamento de conhecimento.
As cinco propostas apresentadas a seguir, baseadas nessas premissas, poderiam triplicar a participação do setor de educação nos desembolsos do Banco nos próximos anos. Trata-se de uma boa oportunidade para avançar em um assunto crucial para o desenvolvimento econômico e social do país.
1ª proposta: Fundo BNDES Educação
Criar um fundo para captar recursos (públicos e privados) para aplicação em iniciativas com alto potencial de efetividade (evidence-based policymaking). Esse fundo poderia ser criado sob uma estrutura de organização da sociedade civil de interesse público (Oscip) ou como um fundo contábil com CNPJ próprio.
A estruturação de um fundo permite uma atuação mais célere do que as formas de apoio mais tradicionais, o que o torna mais compatível com a urgência do tema da educação. O BNDES já tem experiências de sucesso como gestor técnico e financeiro de fundos de terceiros, além de interlocução e diálogo com diversas empresas (possíveis investidores).
Uma possibilidade de aplicação dos recursos é a promoção de prêmios que recompensem os professores que conseguirem aumentar o desempenho dos alunos em avaliações externas à escola. Diversos estudos mostram que estimular o desempenho dos professores por meio de premiações condicionadas à melhora do aprendizado aumenta o aprendizado dos alunos em contextos onde as condições de ensino são deficientes.
2ª proposta: Apoio condicionado à gestão por resultados
Condicionar o financiamento do BNDES a estados e municípios à implementação de gestão por resultados nas escolas e nas redes de ensino. Estados e municípios têm sido clientes cada vez mais frequentes no BNDES, com participação média de 6% nos desembolsos entre 2009 e 2017.
Há evidências de que a prática de gestão por resultados pode ter boa relação efetividade-custo. Redes escolares que se saem melhor nos indicadores de aprendizagem são as que usam dados para acompanhar o aprendizado dos alunos ao longo do ano e planejar as aulas, bem como os horários mais adequados para o ensino; usam métodos de monitoramento das atividades feitas por professores; estabelecem metas de aprendizagem; e usam algum tipo de premiação para bons professores. São ações simples de serem tomadas e com alto potencial de retorno.
3ª proposta: Recursos não reembolsáveis escaláveis
Utilizar recursos não reembolsáveis para um pequeno conjunto de iniciativas que superem pontos fracos do sistema de ensino, buscando incentivar saltos de qualidade, induzir e disseminar comportamentos, melhores práticas e ações inovadoras.
A proposta contemplaria ações de monitoramento e avaliação garantindo transparência, aprendizado institucional e geração de novas operações dando continuidade ou ampliando a escala dos projetos testados, de forma ainda mais efetiva. O apoio não necessariamente será restrito a operações não reembolsáveis, podendo ser efetivado em um segundo momento por meio de operações de financiamento.
A Chamada Pública BNDES Educação Conectada é um exemplo desse tipo de ação, a que podem se somar iniciativas estruturantes como projetos de aprimoramento da gestão das redes de ensino, de formação de professores e de inserção da tecnologia como ferramenta pedagógica.
O apoio não necessariamente será restrito a operações não reembolsáveis, podendo ser efetivado, em um segundo momento, por meio de operações de financiamento (o que explica o uso do termo “recursos escaláveis”).
4ª proposta: Projetos de educação para estados e municípios
Estruturar, ofertar e financiar projetos educacionais a estados e municípios com avaliação de impacto posterior, a partir da expertise em elaboração de projetos e em monitoramento e avaliação já adquirida pelo BNDES e de diagnósticos baseados em experiências benchmark e nas evidências disponíveis. Para o sucesso da proposta, julga-se fundamental o trabalho conjunto com os gestores locais de educação (secretarias estaduais e municipais).
Exemplo: Financiar investimentos integrados nas redes de ensino com objetivo de: (i) aperfeiçoar os instrumentos de gestão; (ii) aprimorar os planos e práticas pedagógicas; (iii) melhorar a infraestrutura física; e (iv) reforçar a formação dos profissionais de educação. Parcerias entre estados e municípios de menor porte devem ser estudadas.
5ª proposta: Apoio à reforma do ensino médio
Financiar os investimentos necessários para adequação das redes estaduais de ensino às mudanças previstas pela reforma do ensino médio, que envolvem a remodelagem para oferta de cinco diferentes itinerários formativos aos alunos, com destaque para o ensino técnico e profissionalizante.
Exemplos de atuação possíveis nesse sentido seriam o apoio à gestão do novo modelo, além de financiamento para o investimento e ação nos cinco eixos estruturantes: construção da base curricular, desenvolvimento dos itinerários formativos, infraestrutura, formação dos professores e dos demais profissionais e preparação de material didático.
O Banco poderá contribuir como articulador de parcerias estratégicas, envolvendo especialistas e instituições com reconhecida atuação no tema para apoio ao desenho e execução dos projetos.
* Ricardo Barboza é economista formado pela UFRJ, mestre em Macroeconomia e Finanças pela PUC-Rio e mestre em Economia da Indústria e da Tecnologia pela UFRJ. É gerente do Departamento de Pesquisa Econômica da Área de Planejamento do BNDES, além de professor colaborador de macroeconomia da COPPEAD e membro do Grupo de Conjuntura Econômica da UFRJ. Twitter: @menezes_barboza
* Conrado Leiras Matos é engenheiro formado pela UFRJ, com graduação sanduíche pela Supélec - França. Atua como gerente do Departamento de Educação e Cultura da Área de Gestão Pública e Socioambiental do BNDES.
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